sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Aqui estou, de novo...

Já que meus colegas resolveram voltar a dar as caras por aqui, resolvi também dar uma aparecida - depois de um longuíssimo tempo sem postar nada.
Em 2010 tive a correria, que não foi pouca, como desculpa pelo sumiço. Não me lembro de ter escrito uma única crônica que prestasse. Poemas? Acho que lá uma meia dúzia, talvez. Mas tudo bem meia boca, para falar a verdade.
Não que a inspiração tenha baixado agora, e eu tenha escrito alguma coisa brilhante. (NOT!) Não é esse o caso. Mas, enfim, para não enferrujar de vez (já que estou morrendo de medo de não conseguir escrever mais), vamos lá:

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Produto Orgânico

Eu digo

à calma
o bom do dia

que não se preocupa
por onde trombar

no trânsito
de almas
de tombos ao chão
aspereza
de rir

agre doce
sorriso
colhi
pétalas

que me joga

poeta

do asfalto
farto

de todo dia
tropeçar

em pressa.

No que se deve
ser
mais rápido

adiante

- Apressa!

- trombar a perfeição
inventada
de pétala de naylon.

Desiludir sintética
a fibra esgarçada,

a minha gargalhada
(tenta)disfarçada,
(chora) desgraçada,

mais adiante
se cala

(acomodada).

Noutro dia
na calma se tropeça

quem sabe
se não em flor inteira
d'uma verdade
que se arremessa
em verde confessado,

descanso d'alma
que verso abraça?

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Discordâncias


A beleza das palavras de amor

Não está no canto ou no silêncio dos olhares,

Mas no despertar da comunhão dos lábios.

O peso da nossa saudade

Não está precisamente na ausência,

Mas em nossas lembranças, tão vivas.

O encanto da relação que se resume nas palavras não ditas

Não está em não as dizer,

Mas na iminente possibilidade de dizê-las.

A sabedoria do meu coração

Não está no nexo dos meus sentimentos,

Mas na incoerência própria dos corações humanos.


Então

Eu quero um beijo,

Eu quero a presença,

Eu quero dizer e ouvir dizer,

Eu quero a incoerência.


Caso contrário, não quero!

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O crime perfeito


Cada amante ama à sua maneira.

Cada amor é impressão digital.

Mas com a experiência de um ladrão velhaco,

Alguns amantes nos furtam o fôlego.

Levam-nos o coração.

Roubam nossa alma.

E não deixam sua marca.


Mas eu não quero um crime perfeito.

Quero as tuas impressões em mim.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

No meu devido lugar - V

Timidez

Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...

- mas só esse eu não farei.

Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...

- palavra que não direi.

Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,

- que amargamente inventei.

E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...

e um dia me acabarei.

[Cecília Meireles]

No meu devido lugar - IV

Meu Sonho


Parei as águas do meu sonho
para teu rosto se mirar.
Mas só a sombra dos meus olhos
ficou por cima, a procurar...
Os pássaros da madrugada
não têm coragem de cantar,
vendo o meu sonho interminável
e a esperança do meu olhar.
Procurei-te em vão pela terra,
perto do céu, por sobre o mar.
Se não chegas nem pelo sonho,
por que insisto em te imaginar?
Quando vierem fechar meus olhos,
talvez não se deixem fechar.
Talvez pensem que o tempo volta,
e que vens, se o tempo voltar.

[Cecília Meireles]

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

A física do amor não correspondido

O ponto A declara seu amor ao ponto B.

Logo, do ponto A, a fonte primária,

O amor segue sua trajetória linear rumo ao ponto B.

Ao atingir a superfície de B, dois fenômenos acontecem:

A reflexão, também conhecida como amor não correspondido;

E a refração, que pode desviar o amor de seu objetivo.

Nesse último caso, o amor pode parar no estômago,

E então nasce a paixão.

Pode também parar mais abaixo, o que causará excitação.

Mas mesmo não correspondido, parte do amor deve estar em B.

No meu devido lugar - III


A Arte de Amar

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.

A alma é que estraga o amor.

Só em Deus ela pode encontrar satisfação.

Não noutra alma.

Só em Deus — ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.

Porque os corpos se entendem, mas as almas não.


[Manuel Bandeira]

Sobre esperanças e verdades

O que nos resta quando nos tiram toda a esperança? O choque de realidade é o meu melhor palpite. O confronto com a impossibilidade e a inexistência de alternativa nos liberta. Dá alívio. Devemos admitir: a esperança é um fardo. É o próprio peso. Ou melhor: é a prisão de vidro, onde se tem noção da realidade do entorno, mas não se pode experimentá-la porque preso. Quando nos tiram toda a esperança, portanto, ganhamos a liberdade.

Se aqueles que nos desesperançam também são aqueles que nos libertam, aqueles que nos dão esperança são também aqueles que nos trancafiam. De fato, não há presente mais amargo que a esperança. Lembro sempre dos pobres troianos. Ilhados. Como haveriam de ganhar a guerra? Pior do que o cavalo, os gregos deliberadamente deram a esperança. Foram deliberadamente cruéis.

O presente mais doloroso, no entanto, vem daqueles que não querem presentear; daqueles que não querem dar esperança, mas que, agindo assim, enchem de flores os nossos pensamentos. É o trair-se ingenuamente doloroso. É a delação, em nome da amizade, do amigo de infância (para o seu bem; para o meu bem). É aquele “não” que nunca se pareceu com um “não”. O “não” com a cara do “sim”. Essa é a maior dor, que causa a oxidação da alma. A dor da esperança que aprisiona.

O que me leva a crer que só teremos paz quando imperar a verdade. Especialmente a nossa verdade, capaz de derrubar as paredes de vidro. A verdade que sufoca a esperança. A verdade que é o antônimo da esperança.